quarta-feira, 27 de abril de 2011

Entrevista para Folha de São Paulo

São Paulo, domingo, 28 de março de 2010

Cuidado, frágil Com "ossos de vidro", Simone Urbano da Costa busca formas de seguir adiante sem quebrar


Simone Costa, portadora de uma síndrome rara

IARA BIDERMAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Para chegar ao apartamento de Simone Urbano da Costa, 33, é preciso subir cinco andares de escada. É isso o que mais está atrapalhando sua vida no momento. "Gosto de sair, quero trabalhar, mas agora está ficando difícil", diz ela.
Simone é portadora de Osteogênese Imperfecta (OI), síndrome de origem genética conhecida como "ossos de vidro". O nome e o pouco conhecimento do distúrbio fazem muita gente pensar que é apenas uma fragilidade imensa dos ossos, que se quebram ao menor impacto.
Portadores dessa doença rara (atinge 0,01% da população) costumam ter outras características, como baixa estatura, miopia, má formação crâniana e dentinogenesis imperfecta, em alguns casos. Nos casos mais graves, como o de Simone, o distúrbio causa deformações e a perda da mobilidade.
Ela própria passou a infância achando que o que tinha eram apenas "ossos fracos" e que não podia "fazer arte", cair ou se machucar para não quebrá-los.
"Eu era a caçula de três filhas, fui superprotegida. Até entrar para a escola, não sentia que era tão diferente." A irmã do meio, Eliane, é portadora de OI tipo 1, a mais leve. Ela teve uma única fratura na vida, não perdeu a mobilidade ("anda até de salto alto") e cresceu um pouco mais que Simone, atingindo 1,36 metro de altura. Simone tem 1,15 metro. E a irmã mais velha não tem nada, "nem estria", segundo Simone.

Quando foi para a escola, aos seis anos, ela já sabia ler. Aprendeu nas internações hospitalares, quando sofria fraturas ou era submetida a cirurgias. A primeira internação foi logo após o parto -Simone nasceu com as costelas e o fêmur quebrados.
As fraturas se sucederam na infância. Como era muito pequena, ela ficava internada junto com os bebês na ortopedia. Sem ter com quem brincar, aprendeu a ficar sozinha e a ler para passar o tempo.

Baixinha atrevida
Com seis anos, começou a frequentar a escola. Na primeira vez em que um colega a chamou de "baixinha atrevida de pernas tortas", partiu para cima e bateu no menino. Sim, era atrevida, e decidiu que não ia deixar ninguém "montar em cima dela".
Quando estava no início da puberdade, foi internada na esperança de fazer uma cirurgia para corrigir a escoliose grave -tem um desvio de 70 graus em sua coluna. A operação foi considerada muito arriscada, e Simone teve de sair do hospital do mesmo jeito que entrou.
"Achei que ia operar e sair com tudo tudo perfeito. Fiquei frustrada, mas levei a vida."
Como geralmente acontece com os portadores de OI, as fraturas diminuíram na adolescência. E Simone começou a ter mais amigas, a encontrar a sua praia. "Amava quando chegava sexta-feira. Eu me arrumava toda e minhas amigas me levavam para as danceterias."
Como sua mobilidade ainda não estava comprometida, Simone dançava bastante. Sua tribo era a da música eletrônica, e ela descobriu que as melhores baladas eram as GLS. "Nesses lugares, há menos preconceito, as pessoas não viravam o rosto quando me viam. Todo mundo era diferente, eu achava aquilo maravilhoso."
Até agora, ela não encontrou muitas respostas da medicina para o seu caso. No estágio em que está, não pode fazer cirurgia. E os remédios à base de bisfosfonato de sódio, uma alternativa se usados a partir dos primeiros anos de vida, também não lhe adiantam mais.
Ela tenta melhorar, pelas bordas. Faz fisioterapia, hidroginástica e toma todos os cuidados para não ter fraturas. "Eu não tenho medo de morrer, tenho medo de quebrar". Por conta própria, organiza almoços para portadores de OI e seus familiares.

PS. Entrevista março de 2010.
 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário